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Canta-me um hino!

sexta-feira, dezembro 22, 2006

Natal


Venham cá, sentem-se ao pé de mim que quero-vos falar do Natal.


Natal… é tão simples. No Natal, numa manjedoura, aquecido pela respiração de uma vaca e um burro, nasceu um menino, que Deus, seu Pai, mandou à terra para nos ensinar o amor. No céu acendeu-se uma estrela para indicar o caminho e um anjo apareceu para contar a boa nova.


Natal… é tão simples. Juntem-se mais a mim. Deixem-me dar um beijo nas vossas bochechas coradas e esperem um pouco mais antes de rasgar o papel de embrulho. Apertem as mãos e cantem uma canção de amor e paz. Vamos dedicá-la ao menino que nasceu. E vamos dedicá-la também a todos os meninos do mundo. Aos que ainda são crianças, aos que já cresceram e aos que nasceram sem tempo de crescer. Vamos dedicá-la também aos que não estão aqui pertinho, mas decerto a ouvem no tilintar de algum sino.


Natal… é tão simples. Deixem-se estar um bocadinho com a cabeça no meu colo e vamos dar aquilo que temos de maior. O embrulho mais bonito. Aquele que guardamos como um tesouro no coração. Com um sorriso, com uma lágrima, tirem devagar as fitas, vamos oferecer amor.


Feliz Natal!

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Quase perfeita...

Não chego lá.
Estou tão próximo que a comparação é inevitável. Contudo há sempre uma falha que me afasta da perfeição. Não o suficiente para que não a veja, não conviva com ela. Eu, que nunca aspirei à perfeição, nunca acreditei em pessoas perfeitas, agora queria chegar lá. Queria acertar. Queria ter a estrela que falta para o primeiro prémio do euromilhões.
Fatalmente o dia-a-dia vai-me confrontando com a impossibilidade. Com as minhas limitações. E, mais que nunca, tento. Ser melhor, fazer melhor, superar-me. Para meu infortúnio concluo que essa figura que almejo, essa imagem idílica de mim própria, é uma miragem. Inatingível portanto.
Reduzo-me à minha condição. Vou falhando. Vou ficando um pouco aquém.
Ela ali parada sorri. Nem eu sei se de ironia ou condescendência. Sorri talvez como uma mãe que vê o filho chegar da escola com 99% no teste. “Que bom! Foi quase. Mas foi muito bom mesmo”, diz dividida entre o orgulho e um leve desapontamento mal dissimulado. E o “quase” abate-se sobre a criança. Infeliz por não ter chegado lá. Era só mais um bocadinho… estava quase.
Assim como eu. Quase. E há dias em que o quase é pequeno, imperceptível, e outros em que amplia e a perfeição continua a sorrir já mais longe. Já menos quase comigo.
Um dia, se a agarrar, hei-de fechá-la numa caixa com buracos e nunca, mas nunca mais, a deixo sair de lá.

O Natal dos Outros Meninos

(reedição)


A árvore de Natal cintila de luzinhas na sala. Penduradas nos ramos, bolas vermelhas de pasta de papel que fizemos durante as tardes de domingo à lareira e penduramos com laços prateados. Meninos felizes, de cabelo sedoso e olhos brilhantes. Meninos que se aninham junto a mim no sofá, debaixo do edredão, a comer pipocas e a ver o Shrek 2.
E os outros meninos?
Na escada, à porta de casa dos avós, está o saco de musgo para o presépio. Vai ser montado no fim-de-semana, naqueles momentos únicos de partilha entre avós e netos. O rio de papel de prata, a cabana de pedras e paus. Meninos de mãos sujas que levam à boca. Meninos com a cara coberta de nódoas de alegria. Meninos com lágrimas gordas porque "aquela ovelha era eu que punha!"
E as lágrimas dos outros meninos?
A lista de presentes com destino à Lapónia, revista desde Novembro e sempre com coisas a acrescentar. A certeza da pilha de embrulhos junto ao sapatinho na Véspera de Natal. A desilusão porque o Pai Natal se esqueceu de dois ou três itens mais arrojados (o computador portátil e a câmara de filmar, necessidade básica de uma criança de 6 anos). Meninos gulosos lambuzados de bolo de cenoura. Meninos que cheiram a champô de maçã, ou a cão molhado quando chegam da tarde de brincadeira no colégio.
E as desilusões dos outros meninos?
Se é que se desilude quem nunca teve uma ilusão.
Não, estou errada. Eu é que não concebo como ilusão aquilo que ilude os outros meninos e então, na minha estúpida futilidade, envergonho-me.
A ilusão de uma sopa quente num estômago que dói de vazio. A ilusão de um beijo de boa noite e uma história para adormecer. A ilusão de que uma mão adulta serve para uma festa, um abraço e não para dar pancada. A ilusão de ter uma família. A ilusão de ter quem lhes pegue ao colo quando a noite é muito escura ou se esfolou um joelho.
Ilusões que estão tão longe das luzinhas da árvore e dos presentes da lapónia, que me é impossível quantificar o desgosto que proporcionam.
Não sei nada, eu, desses meninos.
Não sei nada dos meninos que, com 50 dias de vida vão parar pela quarta vez ao hospital, vítimas de maus-tratos. Não sei nada dos meninos que os corpos são violentados, martirizados, desaparecidos. Não sei nada dos meninos que nunca ninguém amou. Não sei nada da crueldade que se abate sobre eles. Não sei nada dos meninos que não puderam ser meninos.

Em minha casa os meninos contam os dias que faltam para o Natal. Cheiram a maçãs e têm olhos brilhantes.
Que sei eu dos olhos e dos cheiros dos outros meninos?
Como são egoístas as minhas ilusões, quando para eles seria apenas a ilusão de ser menino...